Através da vidraça da escola

Antonio Candido entende a literatura como um leque de criações de toque poético, ficcional ou dramático, uma manifestação universal de todos os homens. Não haveria homens que poderiam viver sem literatura. Candido inclui nesse leque literário o folclore, as lendas, os chistes. Os homens necessitariam fantasiar para so- 91 através da vidraça da Escola Reviver, ninguém poderia passar um dia sem se desligar por alguns momentos e embarcar nos sonhos acordados. Jorge Luís Borges, assim como Candido, afirma que as pessoas estão famintas por narrativas, narrativas essas fundamentais para a vida do homem. Não é por acaso, diz Borges, que Hollywood faz tanto sucesso. A “fuga” literária tem qualidade diversa da “fuga” fugaz da cultura de massa. A literatura é a expressão máxima da criação ficcional de um povo – suas crenças, contradições, seus costumes, acontecimentos, leis, transgressões, etc. –, que dá aos homens a oportunidade do “sonho acordado”, cuja função, além da social, é a de manter o equilíbrio psíquico. Nas palavras de Candido (1995, p.242), esse equilíbrio ganha fundamentos de humanização: “[…] talvez não haja equilíbrio social sem a literatura. Deste modo, ele é fator indispensável de humanização e, sendo assim, confirma no homem a sua humanidade, inclusive porque atua em grande parte no subconsciente e no inconsciente.” A literatura traz consigo uma marca ideológica, porém as repercussões de sua recepção no leitor não são controladas por nenhuma classe social. Existe, paradoxalmente, como uma experiência, a um só tempo, coletiva e individual, a partir do contato com o texto literário. O coletivo diz respeito às nossas raízes como seres humanos, é o compartilhamento de uma herança humana comum. Já o individual diz respeito a uma experiência subjetiva no contato com a literatura, que contém dentro dela uma estrutura que permite multiplicar uma vida em muitas. E, como diz Candido (1995, p.244), a literatura “[…] humaniza em sentido profundo, porque faz viver.” 92Ilan Brenmam Outro fator humanizador da literatura é a sua capacidade organizadora das palavras que, no psiquismo, se encontram em dispersão, em estado caótico para expressar as emoções. A literatura ordena, articula e dá sentido, possibilitando ao leitor elementos para uma organização interior. A sociedade brasileira não tem favorecido, para a maioria do seu povo, o contato com a literatura erudita, “castrando”, assim, o potencial efeito dessas obras na personalidade individual e coletiva de nossa gente. O discurso das elites para explicar essa exclusão equivale-se ao ditado popular “dar pérolas aos porcos”, como se o povo não precisasse de literatura por não compreendê-la. Tal reducionismo serve para perpetuar a separação, o abismo entre brasileiros de um mesmo Brasil.

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